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Empreendedorismo em medicina e saúde – Entrevista para o Correio Braziliense

ENTREVISTA

Empreendedorismo em medicina e saúde

Fui entrevistado pelo Correio Braziliense para uma matéria sobre empreendedorismo na área de medicina e saúde. A íntegra da entrevista você encontra aqui.

Correio Braziliense - A preocupação com o empreendedorismo já chegou às clínicas e aos consultórios? Os médicos estão preocupados com isso?

Mario Persona - Acredito que sim, pois a área de saúde vive um momento muito diferente daquele que viveu no passado. Antigamente o simples fato de alguém ter uma formação em saúde, em especial em medicina, já era um passaporte para um relativo sucesso na carreira. A barreira de acesso à carreira ficava só na capacidade de passar no vestibular, pagar uma faculdade e conseguir terminá-la. O diploma era condição suficiente para garantir a sobrevivência em um mercado carente de profissionais e nada competitivo. Você encontrava grandes expoentes, mas também profissionais extremamente medíocres que sobreviviam simplesmente por não existir concorrência.

Em um mercado assim - com exceção daqueles que encaravam a profissão como uma vocação - boa parte dos profissionais não buscava atualização ou sequer estava interessado em oferecer condições de atendimento adequadas aos seus clientes. Que na época não passavam de "pacientes", e precisavam ser isso mesmo para receberem um bom atendimento.

Mas o mercado - o paciente - também fazia sua parte nesse contexto todo. Não enxergava o profissional de saúde como um prestador de serviços, mas como um semideus. Só contestava seu serviço a boca pequena. Existia um quê de sagrado na profissão, uma aura que ajudava a manter o status quo de uma classe que podia dar-se ao luxo de sentir-se intocável em meio aos altos e baixos que assolavam as outras profissões. Mas isso mudou.

Em parte devido à commoditização do ensino, em parte pelo maior nível de instrução e discernimento do mercado, a saúde começou a ser vista como um negócio qualquer. E pior - para os médicos - as pessoas começaram a receber um volume muito grande de informação e algumas até se acham entendidas o suficiente para contestar diagnósticos ou sugerir tratamentos alternativos. Nossos pais assistiram Dr. Kildare e tudo o que achavam que sabiam era medir a temperatura e examinar uma garganta inflamada. Hoje temos TV a cabo e achamos que estamos aptos a fazer uma cirurgia cardíaca ou um implante de silicone. O paciente ficou exigente e sofisticado. Não procura só a cura, procura a prevenção. Não quer o usual, quer o insólito, o inédito, o zen. Mas quer que seja já. O paciente ficou impaciente.

O engraçado é que isso, embora pudesse abalar alguns feudos, foi justamente o que deu um novo impulso à profissão. O ser humano é movido a necessidades e desejos e quando o atendimento a essas necessidades e desejos lhe cai no colo, ele não vai se preocupar em se mexer para conseguir o que quer. Se a árvore em que está lhe dá sombra, por que vai passar para a árvore melhor ao lado se isso implica dar dois passos no sol?

Insira uma dificuldade que gere competição em um ambiente - em qualquer ambiente - e você tem um movimento em busca da excelência. Seja ela buscada na forma de mais dinheiro ou maior prestígio. O empreendedorismo nasce dessa competição, interna ou externa, quando se quer fazer algo para superar os outros, para sair do lugar comum. O empreendedorismo começa onde acaba o comodismo, onde as pessoas deixam de se conformar com o que já alcançaram e esticam a perna um pouco mais, saem de sua zona de conforto. É claro que isso tem, lá no fundo, uma origem no instinto de sobrevivência, na sensação de que quando a fila empurra é melhor dar um passo à frente ou você é pisoteado. Mas também pode ser por estímulos internos, como ambição ou o simples prazer das novas descobertas.

Na medicina, o empreendedorismo no passado recebia apenas os estímulos da ambição ou do prazer da nova descoberta, coisas que às vezes se sobrepunham. Grandes avanços da medicina ocorreram por estímulos assim e os responsáveis foram grandes ambiciosos e grandes exploradores. Exceto quando o sapato apertava no próprio pé, em épocas de epidemias ou quando o profissional atuava em um ambiente de risco, quase não havia estímulos externos a ameaçar a profissão.

Por exemplo, você não encontra muito pouco ou quase nenhum empreendedorismo em sociedades estáveis, como alguns povos que alcançaram um nível de equilíbrio entre necessidade e suprimento. Povos assim existiram durante milênios sem acrescentar uma melhoria qualquer às suas condições de vida, simplesmente porque nada era visto como ameaça. Havia castas bem definidas, a possibilidade de ascensão era zero, o pão e o circo era aceitável e a hostilidade do ambiente, geralmente em climas amenos, domesticada o suficiente para não oferecer riscos significativos. Essa falta de um estímulo constante, que permitiu que povos inteiros a literalmente vivessem deitados em berço esplêndido, foi também o vírus que dizimou civilizações. Nossas Américas são cheias de exemplos disso.

Os médicos que não tinham qualquer desejo de seguir pelo mesmo caminho dos maias ou astecas são justamente os que perceberam antes as ameaças que acenavam para eles no horizonte do mercado. O primeiro passo foi reagir, correndo transformar a medicina em um grande negócio. Não digo isso no sentido venal da coisa, mas naquilo que podemos chamar de profissionalização da medicina, na sua inserção em um contexto de mercado que procura escutar o cliente, identificar suas necessidades e desejos e atendê-lo de forma surpreendente. Eu chamaria esse despertar para o mercado de uma primeira onda da nova prática da saúde.

Porém, outra onda já vem chegando. É a que aponta para a saúde não apenas como um negócio, mas como uma opção. Um mercado amadurecido e esclarecido já não busca o profissional de doença, mas o profissional de saúde. Aquele que é capaz de garantir melhor qualidade de vida, independente de existir uma condição de enfermidade ou não. Será que podemos chamar a isso de uma nova onda de empreendedorismo no campo da saúde? Eu penso que sim.

Correio Braziliense - É possível ser empreendedor atuando nos ramos tradicionais da medicina? De que forma? 

Mario Persona - Não creio. Empreender sempre traz em seu bojo a mudança e à medida que os pesquisadores no campo da medicina exploram novos continentes de sua área do saber, vão deixando atrás de si aqueles que irão colonizar esses novos territórios.

Falo da segmentação do conhecimento médico e do mercado que isso gera. Além disso, é cada vez maior a integração da medicina com outras áreas, como engenharia, informática, polícia, design. Antigamente o médico caçava bactérias, hoje ele caça até bandidos em áreas como medicina forense. Ele precisa estudar artes plásticas, se quiser transformar seus clientes em esculturas gregas. Precisa conhecer informática para reinicializar seu paciente, ler seus dados. E não se surpreenda se logo encontrarmos médicos aprendendo navegação para pilotar nano-comboios de medicamentos pelo interior do corpo humano.

Cada nova descoberta - seja ela gerada pela ambição, espírito explorador ou ameaça do mercado - traz consigo um sem número de possibilidades que os mais empreendedores correrão agarrar. Quem parar de se atualizar não vai perder o bonde, vai ficar nele. É claro que muitos saberão manter uma aura de tradição e até mesmo atuar em segmentos da medicina que começaram no antigo Egito, mas saberão fazê-lo com um bojo de modernidade. Serão como uma Europa, com seus monumentos e tesouros, mas todos eles bem guardados por câmeras digitais e alarmes com detectores a laser.

Correio Braziliense - Fora do sistema tradicional, quais são os nichos de mercado que podem ser explorados por um empreendedor da saúde? 

Mario Persona - São muitos e quando terminarmos de conversar serão mais ainda. Como eu disse, à medida que o mercado vai se sofisticando, as pessoas começam a buscar outras coisas. É uma espécie de hipocondria do cuidar, algo como buscar nos profissionais de saúde não apenas cura, mas o suprimento de suas carências. Somos insaciáveis e queremos sempre algo mais. Antes íamos ao médico por necessidade, por alguma doença. Depois surgiram os serviços que davam suporte ao diagnóstico e ao tratamento. Vimos florescer uma grande indústria de exames, equipamentos e profissões satélites à medicina propriamente dita. Até a indústria do atendimento e da computação médica cresceu em razão disso. Clientes mais exigentes, soluções mais sofisticadas.

Hoje nas sociedades mais bem supridas a busca é por saúde e vida perene, e não por cura apenas. O ser humano está se tornando cada vez mais voltado para o cuidado do corpo, o aumento da expectativa de vida, o bem-estar. Até o turismo médico é hoje um mercado em expansão. Alguns países já descobriram que o conhecimento médico não precisa necessariamente estar limitado aos grandes centros industriais como Estados Unidos e Europa. O saber está onde o cérebro capaz atua e já vimos alguns expoentes da medicina surgindo em países poucos prováveis. Assim como bons profissionais de qualquer área hoje já podem se dar ao luxo de sair dos grandes centros para morar e atuar em localidades aprazíveis, a commoditização da tecnologia também está permitindo que a medicina se desloque dos grandes centros para verdadeiros resorts médicos.

Países como Grécia, África do Sul, Jordânia, Índia, Malásia, Filipinas e Singapura já têm como estratégia de crescimento investimentos na área do turismo médico, e aí entra mais um ramo integrado à medicina, que é a hotelaria hospitalar. Já vemos isso hoje no Brasil, onde alguns grandes hospitais já adotam uma estrutura de hotelaria, embora ainda não estejamos pensando em passar nossas próximas férias em algum deles.

Hoje o turismo médico apela não tanto para o aspecto hoteleiro, pois acomodações assim existem também nos grandes centos. O apelo está no preço, já que é possível fazer cirurgias e tratamentos em países do terceiro mundo a uma fração do que se paga nos Estados Unidos ou Europa e com um nível igual ou superior de tecnologia e competência profissional. Outro apelo está no exótico, em se associar a medicina ocidental convencional a tratamentos alternativos baseados em práticas milenares do oriente. Finalmente, a chamada que fica é: por que pagar mais se você pode fazer aquela cirurgia ou tratamento por muito menos e ainda convalescer na varanda de um hotel cinco estrelas diante de uma praia paradisíaca? Quem vai querer ser operado no inverno em Boston se puder optar por algo assim?

Veja, por exemplo, o Sunway Lagoon Resort Hotel, um complexo médico-hospitalar-hoteleiro na Malásia que é um misto de resort, universidade e parque temático com ares de shopping center. Não deve ser por acaso que seus parques transmitem um ar de uma espécie de Ilha da Fantasia e Shangrilá, e a pirâmide e a esfinge que vi numa foto no site do complexo imediatamente me remeteram, não ao Egito, mas a Las Vegas. É claro que tem tudo o que você pode esperar de um hospital, mas tem muito mais. É esse o caminho que a medicina está tomando.

Correio Braziliense - Quais as características de um profissional da saúde empreendedor? 

Mario Persona - Acho que a reciclagem constante e uma boa visão de marketing são características essenciais ao empreendedor na área de saúde. O marketing lhe dará uma visão do mercado e o ajudará a pensar como mercado. Então o estímulo que o fará reagir não será apenas patológico, mas mercadológico. Ele vai querer saber exatamente o que irá fazer feliz seu cliente, e isso pode não ser apenas uma cura ou um tratamento convencional. O empreendedor deve estar aberto a estímulos que às vezes poderão abalar seu status quo e sua sensação de segurança e conforto. O empreendedor sabe que a carreira é como andar de bicicleta: se parar de pedalar cai.

Mario Persona é consultor, escritor e palestrante. Veja emwww.mariopersona.com.br


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